terça-feira, 23 de maio de 2006

Sobre as palavras

Minha primeira inteligente troca: bonecas por palavras. Palavras são simples, sem tecnolgias. Brincar com elas pode ser muito mais divertido do que parece. Bonecas: eu falava por elas; palavras: ela falam por mim. Com o tempo, eu e as palavras nos tornamos íntimas e hoje elas me permitem ser até possessiva: as minhas são a minha verdade e a minha mentira mais verdadeira; ainda sendo mentira, são verdade. Elas me deixam sonhar com todo encanto que nisso possa haver, destroem e constroem mundo e me fazem ir onde eu jamais poderia estar. Elas me dão o universo e tudo o que eu quiser; não há nada que eu queira que elas não possam me dar. Minhas palavras fazem ser aquilo que não é. Não me arrependo de ter trocado bonecas por palavras. As palavras expressam meus sentimentos e tudo o que eu quero dizer de forma a não deixar óbvio o que está sendo dito; sem falar elas falam. São fantoches, mas só pra quem sabe usar.

domingo, 14 de maio de 2006

Infância.

Um pouco de nostalgia, com uma pitada de revolta. ;D

Descia, corria pelas escadas
Seguia travessa, despreocupada
Ouvia as histórias e estórias
Tudo muito presente na minha memória,
No meu passado, em algum lugar.

O mundo me parecia correto
Tudo tão previsível, certo
Concreto, imutável
Mentira era impensável,
No meu passado, em algum lugar.

Em meio a peças e blocos, eu brincava
Sem sequer imaginar que a inocência logo passava
As pecinhas encaixavam-se com perfeição
Pouco a pouco eu mesma montava a minha canção.

Cabelos longos caídos sobre o rosto
Faziam dos meus olhos vidro fosco
Tão ingênua, eu me bastava
Inconsciente do que me esperava.

Fiz-me crescer,
Construí-me sem perceber
Com base naquele tempo,
Num brusco movimento.

Adolesci sem motivo nem razão
Vi-me diante de problemas sem solução
Revoltei-me do juízo daquele velho tempo
Quis lançar minha memória ao relento.

Numa folha de papel, uma memória lançada
Viva uma lembrança, uma lembrança abandonada
Viva a mentira, a mentira contada
Viva a pseudo-certeza, escondendo a incerteza,
Viva a pseudo-alegria, omitindo a tristeza,
Viva a utopia, quando não se sabe da realidade
Viva o tudo, quando na verdade,
O tudo que se tem é nada.

:p

Isn't someone missing?

Saudades de quando eu era feliz e não sabia. Saudades de quando eu era eu, sem medo de me acharem ridícula. Saudades da minha inocência, que o mundo malicioso me tirou quando eu ainda cheirava a fraldas. Saudades de quando o mundo me permitia sonhar. Saudades de ser mimada. Saudades de um cafuné. Saudades de um mundo encantador que perdi tão cedo. Saudades de não ter que ter responsabilidades. Saudades de não ter compromisso com ninguém além de mim. Saudades de quando meu pai me via como "sua menininha". Saudades do medo do escuro. Saudades de contar segredos pro meu ursinho amarelo. Saudades da garotinha espevitada e exibida que tinha cabelos longos, lisinhos e de rostinho bolachudo. Saudades da queridinha dos professores. Saudades do Papai Noel. Saudades das minhas bonecas, que me abraçavam com intensidade. Saudades de cortar o cabelo das minhas Barbies toda vez que estava com raiva. Saudades de conseguir o que eu queria, chorando e fazendo birra. Saudades das promessas que me faziam. Saudades de acreditar que o mundo era perfeito. Saudades de acreditar que todas as pessoas eram boas e legais. Saudades de acreditar naquilo que eu queria. Saudades de dividir meu picolé com meu cachorro. Saudades do meu cachorro. Saudades de achar que tudo no mundo dependia da nossa vontade. Saudades de manipular as pessoas ao meu redor. Saudades da princesinha que acreditava um dia encontrar seu príncipe encantado. Saudades de não saber que um amor pode acabar. Saudades de não pensar que, um dia, eu vou morrer. Saudades de ser sincera demais e às vezes, até inconveniente. Saudades de ser teimosa ao extremo. Saudades de não levar desaforo pra casa. Saudades de ser protegida. Saudades de ser iludida. Saudades de ser criança.